Diz-se em política que
somente dois fatos são importantes: o fato novo e o fato consumado. O fato
consumado da morte trágica do ex-governador Eduardo Campos produziu o fato novo
da candidatura de Marina Silva, que mudou a eleição. Agora, outro fato novo pode
interferir nas eleições de outubro. Atribui-se ao ex-diretor de Abastecimento
da Petrobras Paulo Roberto Costa, preso na sede da Polícia Federal em Curitiba,
a ameaça de que, se abrir a boca, não vai ter eleição . Seria uma maneira de
mandar um recado para seus muitos amigos políticos para que o tratassem bem, e
à sua família.
Como nos melhores filmes da
máfia, ao ver que não tem chance de se livrar da prisão, e de que empresas de
seus filhos começaram a ser investigadas ontem pela PF, Paulinho , como Lula o
chamava, resolveu negociar com a Justiça delação premiada, incentivado pela
mulher, Marici - que há tempos vinha se desentendendo com o advogado Nélio
Machado, ontem trocado pela advogada paulista Beatriz Catta Preta, especialista
em delações premiadas.
O depoimento de Costa será
para o juiz Sergio Moro, especialista em processos de lavagem de dinheiro que
assessorou a ministra Rosa Weber no julgamento do mensalão. Com fama de
rigoroso, Moro não soltou imediatamente os doleiros e pediu mais esclarecimentos
ao Supremo tribunal Federal quando o ministro Teori Zavascki deu uma liminar
soltando todos os acusados pela Operação Lava-Jato.
Deu tempo, assim, para que
Zavascki recuasse da decisão inicial, mantendo todos presos por oferecerem perigo de
fugir do país. Tudo indica que Costa vai falar o que sabe, o que pode, sim,
influenciar as eleições de outubro, não a ponto de inviabilizá-las, mas de
atingir políticos importantes em diversos partidos.
Costa é fruto de um dos mais
perversos efeitos colaterais do presidencialismo de coalizão, distorcido na era
Lula. Indicado por consórcio partidário composto por PP, PMDB e PT, esteve à
frente da Diretoria de Abastecimento da Petrobras de 2004 a 2012, saindo de uma
espécie de geladeira em que fora colocado por sucessivas diretorias anteriores
ao lulismo. Entre outros negócios da estatal, ele estava na diretoria que
concretizou a compra da refinaria de Pasadena, nos EUA, contestada pelo
Tribunal de Contas da União.
Nos documentos encontrados
em sua casa e em empresas pela PF, há muitas indicações de negociatas
envolvendo empreiteiras e políticos, tudo junto e misturado com a ajuda do
doleiro Alberto Youssef, também preso.
Um deles é o deputado
federal André Vargas (sem partido), que está tendo sua cassação pedida pelo
Conselho de Ética da Câmara por ter usado jatinho fretado por Youssef para um
passeio com a família. Outro, o secretário nacional de Finanças do PT e
tesoureiro da campanha de 2010 da presidente Dilma, João Vaccari Neto, acusado
de ser um dos contatos de fundos de pensão com a CSA Project Finance
Consultoria e Intermediação de Negócios Empresariais, empresa que Youssef usou
para lavar R$ 1,16 milhão do mensalão, segundo a PF.
O ex-deputado José Janene,
um dos 40 réus no processo do mensalão no STF, morto em 2010, era acusado de
ter se apropriado indevidamente de R$ 4,1 milhões, usando como laranja o
advogado Carlos Alberto Pereira da Costa, também preso e que fez as acusações a
Vaccari Neto dentro de uma negociação de delação premiada.
Ele é réu em duas ações
penais: uma sobre supostas remessas fraudulentas para o exterior do laboratório
Labogen, de propriedade de Youssef e que pode causar mais danos ao candidato do
PT ao governo de SP, Alexandre Padilha; outra de lavagem de dinheiro de Janene
por investimentos em uma empresa paranaense. Padilha foi acusado de, como
ministro da Saúde, ter aprovado o Labogen, que servia de fachada para o doleiro
enviar dinheiro para o exterior.
Documentos apreendidos com
Costa, e que ele tentou destruir, mostram uma contabilidade detalhada sobre
repasses de empreiteiras para campanhas políticas. Anotações do ex-diretor
registram, por exemplo, o repasse, em 2010, de R$ 28,5 milhões ao PP, partido
da base aliada cujo líder à época do mensalão era Janene, um dos responsáveis
pela indicação de Costa ao cargo.
As empreiteiras citadas no
documento são Mendes Júnior, UTC, Constran, Engevix, Iesa, Toyo Setal e Andrade
Gutierrez. Mesmo que fale tudo o que sabe, vai haver eleição, assim como houve
a Copa. Resta saber com que candidatos.
MERVAL PEREIRA- O GLOBO -
23/08
Sábado, 23 de agosto, 2014.
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