A gente olha pela janela e vê, lá
longe, a notícia de que um monte de países, grandes parceiros do Brasil, fechou
acordo para facilitar o comércio. A gente olha para o umbigo e mal consegue
enxergá-lo, tamanha a névoa de crises, como a da mixórdia político-jurídica do
impeachment.
Parece, pois, exótico, coisa de
outro mundo, tratar da Parceria Transpacífico, o acordo assinado entre EUA,
Japão, Canadá, México, Chile, Peru, Austrália, Nova Zelândia, Cingapura,
Malásia, Vietnã e Brunei.
Transpacífico? E daí? Um quarto
do comércio do Brasil é feito com os países que assinaram esse acordo; um terço
das nossas exportações vai para lá. Esse tratado facilita o comércio entre eles
porque uniformiza regras de produção (trabalhistas, ambientais, entre muitas
outras), abre mercados para certos produtos etc. Em vez de comerciar com o
Brasil, fica mais fácil (barato, seguro) comerciar entre eles.
É grande o risco de perdermos
mais mercados. Além do mais, a facilitação do comércio vai influenciar decisões
de investimento de grandes empresas (talvez até brasileiras), pois o nosso
grande e ora prejudicado mercado doméstico pode não ser motivo bastante para
contrabalançar os custos do nosso isolamento comercial.
Ainda muito importante, o acordo
Transpacífico e tantos outros que vêm sendo fechados criam padrões básicos,
condições de comércio que se tornam itens elementares de qualquer tratado. Como
o Brasil não participa dessas tratativas, se e quando tentar fazê-lo, vai
chegar atrasado e terá de dançar conforme a música já escolhida por outros.
Por aqui, não anda nem mesmo o
acordo de livre-comércio de carros com a Argentina, firmado faz um quarto de
século e emendado por 41 (sic) protocolos adicionais de enrolação. Desde 1999,
o Brasil (Mercosul) enrola com a União Europeia um acordo comercial geral.
Talvez neste ano Mercosul e UE troquem propostas firmes de negociação,
espera-se, muito. Mas, no fim das contas, a gente mal sabe o que está fazendo.
Para começar, não temos nem boa
política econômica de curto prazo (inflação e contas públicas em ordem,
crescimento econômico regular). Faz mais de década, nosso projeto comercial é
protecionismo mal disfarçado e acomodação de maluquices da Argentina
kirchnerista, às quais em parte aderimos desde Dilma 1.
Na região, no mais, o grande
projeto foi subsidiar empreitadas em países vizinhos, via BNDES, e, na
prancheta doidivanas, há coisas como o Trem do Peru, a ferrovia que iria do
meião do Brasil ao Pacífico, via Amazônia e Andes. A gente não consegue nem
fazer trem no sertão da Bahia ou metrô e variantes de bonde, como na São Paulo
de Geraldo Alckmin. Mas tem essa mania "geopolítica" de Trem do Peru,
coisa de país pobre delirante.
Dilma fez política de conteúdo
nacional genérica e equivocada (compras obrigatórias de produtos nacionais mais
caros, por exemplo, o que ajudou a arruinar a Petrobras e criou um nicho fértil
de corrupção). Enfim, criou mais barreiras de proteção de uma das indústrias
mais ninadas do mundo, as montadoras de carros, entre outras. Mas mesmo boa
parte da indústria é contra essa solução do jeca. Além de nos estranharmos aqui
dentro, estamos alienados do mundo.
Vinicius Torres Freire
Terça-feira, 06 de outubro, 2015
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