Uma
análise de 12 alimentos comuns nas dietas dos brasileiros revelou resíduos de
pesticidas em 60% das amostras e vestígios do uso ilegal de agrotóxicos em mais
de um terço do material. A lista de itens contaminados inclui arroz, feijão,
banana, mamão, laranja, tomate, café e pimentão.
O
estudo foi uma iniciativa do Greenpeace. A organização adquiriu 113 quilos de
12 variedades de alimentos, entre os dias 11 e 13 de setembro, em centrais de
abastecimento de São Paulo e de Brasília. As amostras obtidas foram analisadas
pelo Laboratório de Resíduos de Pesticidas (LRP) do Instituto Biológico de São
Paulo, ligado ao governo do Estado.
O
113 quilos de alimentos foram divididos em 50 amostras, das quais 30 continham
resíduos de agrotóxicos. Desse total, 18 apresentavam algum tipo de
irregularidade, como a presença de agrotóxicos proibidos no Brasil, que não são
permitidos para determinadas culturas, ou em concentrações superiores à máxima
estipulada pela legislação.
No
total, 13 amostras apresentavam agrotóxicos proibidos para aquela cultura
específica. Três amostras continham agrotóxicos permitidos, mas em nível
superior ao máximo permitido.
Duas
amostras de pimentão - uma de São Paulo outra de Brasília, apresentaram sete
tipos de resíduos, incluindo três tipos diferentes de agrotóxicos proibidos
para esse alimento. Em 17 amostras de diversos alimentos havia mais de um
agrotóxico - o que segundo os especialistas provoca o chamado "efeito
coquetel", quando diferentes substâncias interagem e geram efeitos nocivos
que não são fiscalizados.
Das
quatro amostras de mamão estudadas, três apresentaram quatro tipos diferentes
de resíduos. Duas delas estavam contaminadas com procloraz, um pesticida banido
no Brasil e proibido para qualquer alimento. Uma possuía resíduos do pesticida
difenoconazol em concentração nove vezes superior à permitida. Duas outras
continham famoxadona, um pesticida não permitido para o mamão.
Embora
os riscos sejam maiores entre os trabalhadores que lidam diretamente com os
agrotóxicos, permanecendo mais expostos a eles, Neice afirma que a exposição a
qualquer resíduo, mesmo em pequena quantidade, oferece riscos graves quando
envolve grande número de pessoas.
"Quando
as pessoas estão expostas em grande escala, é praticamente inevitável que o
produto vá atingir, por exemplo, mulheres grávidas. Vários deles produzem
interferências endócrinas - e alterar os hormônios de uma gestante pode ser
extremamente nocivo."
Produtos
como a famoxadona, um fungicida que foi encontrado em amostras e mamão em
concentrações nove vezes superiores à permitida, costumam afetar o fígado, de
acordo com Neice.
"Todos
esses produtos podem irritar a pele e as mucosas, mas o fígado é o grande foco
de quase todos eles, porque esse órgão tem o papel de metabolizar as toxinas
que absorvemos por via oral ou por outras vias", explicou.
De
acordo com Neice, o procloraz, um fungicida totalmente proibido no Brasil, mas
que foi encontrado em amostras de mamão, produz disrupção endócrina - isto é,
altera os hormônios. "Chegou-se à conclusão de que esse produto não era
seguro para uso no mercado e ele foi banido. A razão para isso não foi o
câncer, nem a neurotoxicidade, mas a desregulação endócrina que ele
causa", disse.
O
difenoconazol, fungicida também encontrado em amostras de mamão muito acima dos
níveis permitidos, além de também produzir alterações endócrinas, é considerado
um possível causador de câncer, segundo Neice.
"A
possibilidade de um acúmulo dessas substâncias no organismo tem que ser
considerada. Mas, no caso do difenoconazol, por exemplo, não é preciso uma
exposição cumulativa para desencadear um câncer. Uma única exposição, em tese,
poderia ativar o mecanismo de uma pessoa que já tem propensão genética",
explicou.
'Preocupante'.
Comprando laranjas em um hortifruti da zona oeste, em São Paulo, a professora
Maria José Brandão não se surpreendeu com o resultado das análises.
"Sabemos que há esse problema dos agrotóxicos. Há muito tempo sabemos que
os morangos, por exemplo estão impregnados com esses venenos", disse.
Segundo
ela, a questão é "muito preocupante". "Eu venci um câncer de
mama e sei como pode ser grave o contato com esse tipo de substância. Me
preocupa demais. Eu ponho os alimentos na água com vinagre antes de consumir,
mas não há muito o que fazer, a não ser comprar nas feirinhas de orgânicos, mas
além de ser mais caro, não sabemos se esses produtos são mesmo livres de
agrotóxicos. Não há como ter confiança", afirmou.
Ao
saber o resultado da pesquisa, o advogado Luiz Sandoval também apontou o câncer
como a principal preocupação ligada ao consumo de agrotóxico. "Entendo que
o número excessivo de casos de câncer se deve muito aos agrotóxicos. Não vejo
justificativa para um aumento tão grande dos casos de câncer a não ser os altos
níveis desses produtos", declarou.
Sandoval
não vê saída para o consumidor. "A pessoa que pode compra produtos
orgânicos. Mas nem todo mundo pode arcar com os custos. Por outro lado, os
agrotóxicos são necessários, porque senão as pragas tomam conta das
plantações", ponderou.
"As
pessoas não estão atentas ao problema dos agrotóxicos. Eu prefiro comprar as
frutas que têm casca, como banana e laranja, porque é possível eliminar grande
parte dos agrotóxicos ao descascar. No caso das verduras e legumes, não há como
escapar."
(AE)
Quarta-feira,
1º de novembro, 2017 ás 10hs50
Nenhum comentário:
Postar um comentário