O
grito pelo impeachment estava na garganta do povo brasileiro desde as últimas
semanas de 2014. Quando ficou evidente que a campanha presidencial se
desenrolara num ambiente de mistificação e ocultação da realidade, tipificando
estelionato eleitoral, o impeachment passou a frequentar as redes sociais. Foi
esse tema que motivou as duas primeiras manifestações populares, ainda em
novembro de 2014. E foi ele que deu causa à histórica mobilização nacional do
dia 15 de março de 2015. Enquanto análogas iniciativas aconteciam país afora,
aqui em Porto Alegre, do alto de um carro de som, eu vi esse grito nascer. Como
testemunha ocular e ativa dos fatos, certifico e dou fé: o impeachment foi e
continua sendo, em primeiríssimo lugar, exigência do povo brasileiro.
Portanto,
quando o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, em entrevista ao jornal O
Globo (10/02), declara que o "impeachment foi desencadeado por vingança de
Cunha", sei que estou diante de uma flagrante mentira, de uma notável
desonestidade intelectual. E desonestidade intelectual, desonestidade é.
Existem políticos tão pouco afeitos à verdade que não a reconheceriam mesmo se
pingada em seus olhos como colírio. Em março de 2015, poucos dentre aqueles
milhões de brasileiros que saíram às ruas sabiam o nome do presidente da Câmara
dos Deputados. Raros, mais bem informados, tinham conhecimento de que ele
chegara ao posto contra a vontade do Planalto. Raríssimos estavam cientes de
que o sujeito não era trigo limpo. Confundir impeachment com Cunha não é esperteza.
É mistificação e velhacaria.
Em
fins de março de 2014, três dezenas de requerimentos pedindo a instauração do
processo contra a presidente Dilma estavam empilhados sob a guarda do
presidente da Câmara. E o que ele fez? Nada. Diante dessa omissão, o povo
voltou às ruas, meio frustrado, no mês de maio. Qual a reação de Eduardo Cunha?
Nenhuma. O povo voltou às ruas em agosto. E nada. Em outubro, um acampamento
instalou-se, durante semanas, diante do Congresso. E mais uma vez, nada. Até
que, em 2 de dezembro(!), Cunha despachou o requerimento que passou a tramitar.
Cabem,
então, estas perguntas: durante todo o período descrito, alguém ouviu um
discurso de Eduardo Cunha a favor do impeachment? Concedeu ele uma entrevista
favorável? Emitiu qualquer gesto de apoio, ao longo desses oito meses? Eduardo
Cunha, leitores, atrapalhou o processo o quanto pode, isto sim. Usou-o para
maquinações de interesse pessoal. E permitiu que ele se contaminasse com as
revelações surgidas em torno de seu nome. Rindo do descosido Cunha, o roto PT
tentou desacreditar o sonoro clamor nacional.
Por
tudo isso, bem ao contrário da inversão que o ministro Cardozo tenta promover
nos fatos para servi-los como lhes convém, não hesito em afirmar que Eduardo
Cunha e Luís Roberto Barroso do STF são os dois maiores inimigos do
impeachment. Cunha por tudo que não fez. Barroso pelo que fez ao,
maliciosamente, confirmar o STF como puxadinho do PT.
(Percival Puggina)
Percival
Puggina, 71, membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário
e escritor
Sábado,
13 de fevereiro, 2016
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