Na
origem das coisas, quero dizer, na mitologia grega, o Rei Momo, era uma mulher
que foi até deusa e que sendo deusa podia também ser juíza e, por isso, os seus
julgados ante a crença de que eram semeadores do bem dispensavam a interposição
de recursos.
Momo
personificava a noite. E era conhecida também pelo apelido de Reclamação.
Os
encantos divinos dessa rainha e juíza foram se diluindo assim que os romanos,
por maldade histórica ou erro de tradução, concluíram que a deusa, e ao mesmo
tempo juíza grega, era na verdade um deus, e melhor dizendo, um deus que era
também juiz.
Tendo
como lema o “seja você quem for, seja o que Deus quiser”, os romanos escolhiam
três dias a cada ano para uma grande festança com churrasco e vinho. Cavavam
enormes valas nas quais assavam as carnes dos bichos caçados nas vésperas e
abatidos conforme a demanda ao longo dos três dias.
Segundo
o historiador Marco António, os romanos chamavam de carnivália a vala onde eles
assavam as carnes e daí veio a palavra carnaval.
Para
o governo dos três dias de carnaval os romanos elegeram Rei a deusa Momo dos
gregos. Não era bem um Rei encarnado num homem, mas originariamente uma mulher
que com o passar do tempo, aí sim, se assumiu e depois de muitas paradas e
quebras de armários chegou lá.
A
condição de elegibilidade para Rei Momo era ser militante, defensor escancarado
do Império de César, dono de insuspeitável alegria, irradiante simpatia e,
também, muito bonito. O que para estas paragens não chega a ser o caso.
Tempos
depois uma reforma eleitoral feita às pressas, no maior casuísmo, tornou
inelegível quem não pesasse no mínimo 120 quilos, exigindo-se a vistosa
obesidade também para as candidatas a Rainha Momo.
Tudo
isso ideia, já naquele tempo, da bancada do agro negócio e de um pessoal da OAB
do Maranhão sob a justificativa de que o sobrepeso simboliza poder e fartura, o
dólar em queda, a inflação controlada, o real valorizado, o desemprego
despencando, os salários com poder de compra, enfim, o crescimento da produção,
a começar pela industrial.
Mas
como isso tudo foi sumindo do cenário e constatando-se que metade da população
do País está obesa, o que só aumenta as despesas do governo e dos planos de
saúde, a primeira condição de elegibilidade para os tronos de Rei e de Rainha
do carnaval foi revogada, determinando-se que os candidatos agora tenham que
ser magros na proporção da altura e do peso.
Ora,
quem sob a visibilidade geral inerente ao Poder, Rei ou Rainha, Presidente ou
Presidenta de qualquer coisa, não tem que se mostrar como símbolo do bom
exemplo?
Quando
algum ungido para alguma altura diz que não gosta de ler livros e que seu
primeiro e único diploma na vida foi o que lhe permitiu ascender a curaca, qual
a criança que depois disso vai querer ir para a escola?
Vale
também para o Rei Momo e Rainha Momo, enquadráveis na lei ficha suja da
obesidade, caso não se apresentem magros e sarados. Casal de monarcas obesos é
o mesmo que dizer às crianças – bebam mais refrigerantes, comam mais batata
frita, mais pipocas, comam mais sanduiches de lanchonetes...
Em
Palmátria, a capital de um País descoberto pelo poeta Tribuzi no último século,
houve há pouco uma grande confusão na escolha do novo Rei e da nova Rainha
Momo.
Quando
tudo parecia seguir nos conformes dos previamente combinados, como sói
acontecer igualmente no Maranhão, sabendo-se antemão nos bastidores quem seria
a Rainha Momo eleita, eis que desponta uma morena que parecia ter acabado de
sair de uma tela do Di Cavalcanti.
Alta,
esguia, dedos de pianista, sorriso cativante, daqueles de encarcerar doleiro e
até diretor da Petrobrás, dir-se-ia que era a reencarnação da modelo do gênio
pintor, a Marina Montini.
Ah
o júri não gostou. Seria a revogação do que havia sido negociado antes.
Esgotados todos os argumentos, um inflamado jurado saiu com mais este:
-
Esta candidata é muito alta, gente. E mulher alta cansa.
-
Quem falou que mulher alta cansa? Quis saber outro jurado.
–
Ora, o Sarney...
-
Ou o Cabral?
Ninguém
achou graça. Mas o Sarney que acompanhava tudo pela televisão, qual o dono da
tabacaria, aquele do poema de Fernando Pessoa, sorriu.
(Edson Vidigal, Advogado, foi
Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal.)
Quinta-feira,
04 de fevereiro, 2016
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