Os
recursos públicos repassados aos partidos brasileiros pelo Fundo Partidário
representam uma “caixa-preta” de R$ 3,57 bilhões e financiam gastos obscuros e,
em muitos casos, questionados pela Justiça Eleitoral. Entre as despesas estão
viagens de jatinho, bebidas alcoólicas, jantares em churrascaria e até contas
pessoais de dirigentes.
O
valor se refere ao total recebido pelos partidos entre 2011 e 2016, corrigido
pela inflação, e está nas prestações de contas à espera de julgamento do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A estimativa da corte é que o passivo some
aproximadamente 560 mil páginas, divididas em centenas de pastas. As legendas
costumam apresentar notas fiscais sem especificar como, quando, onde e para
qual finalidade foi gasto o recurso público.
Técnicos
do TSE ainda tentam avaliar as contas referentes a 2011, que foram entregues em
abril de 2012. O julgamento desse material vai ocorrer no dia 28 de abril, dois
dias antes da prescrição, cujo prazo é de cinco anos – a partir daí, não é mais
possível punir os partidos por eventuais irregularidades.
A
reportagem teve acesso aos relatórios já finalizados referentes a 29 partidos
que estavam em funcionamento há seis anos. Os técnicos recomendaram a rejeição
das contas de 26 – entre eles PT, PMDB e PSDB. Apenas PRB, PSD e PV receberam
parecer pela aprovação, mas ainda assim com ressalvas.
As
irregularidades mais comuns constatadas pelo TSE nos dados de 2011 se repetiram
em prestações de contas mais recentes, de 2013 e 2015, segundo análise feita
pelo Estado na documentação. Umas delas é o uso rotineiro de jatos fretados por
dirigentes, com custo até centenas de vezes superior a viagens em avião de
carreira.
Na
análise das contas do PDT de 2011, os técnicos questionaram o uso de aeronaves
sem a indicação de itinerário, prefixo, horário de embarque e identidade dos
passageiros. No parecer, o TSE citou, ainda, um entendimento normativo do
Tribunal de Contas da União (TCU): “Um dos requisitos da boa e regular
utilização dos recursos públicos é a economicidade, isto é, a minimização dos
custos”.
Na
prestação de contas do PSDB de 2015, porém, aparecem diversas notas de
fretamento da Reale Táxi Aéreo sem essas informações. O presidente nacional,
senador Aécio Neves (MG), costuma voar em aviões alugados. Recentemente, um
jato com o tucano derrapou na pista do Aeroporto de Congonhas, quando ele se
deslocava de Brasília a São Paulo. Na ocasião, o partido informou que aviões
fretados eram usados “ocasionalmente”.
Genérico.
Na maioria dos casos, as prestações informam de forma genérica o serviço
prestado. Nas contas do PSB de 2015 há uma nota de uma rede varejista referente
à compra de uma TV Samsung Led de 55 polegadas e definição 4k. Não há
informação sobre onde o aparelho é usado. As contas de 2011 do partido também
já tiveram parecer pela rejeição em razão da falta de informações sobre gastos.
Na
prestação de contas do PT daquele ano, os técnicos encontraram notas de R$ 5
milhões da Santana e Associados Marketing, do marqueteiro João Santana, que não
correspondiam aos “serviços descritos na nota”, segundo o parecer. O relatório
considerou irregular o pagamento.
Nas
contas de 2011, o PRP informou que a sua sede nacional ficava na Rua Santo
André, em São José do Rio Preto, interior paulista. Mas contas de água e luz
apresentadas traziam o endereço residencial do presidente Ovasco Roma Altimari
Resende. A sigla também gastou R$ 1 mil em vinhos.
Os
técnicos do TSE também rejeitaram uma nota de R$ 160 do PPS referente a duas
garrafas de vinho e outra de R$ 9,50 de uma caipirinha consumida em um hotel de
Brasília. Na prestação de contas do PSDC, as notas revelaram que a sigla
contratou uma empresa de marketing, a 74 Propaganda, e outra de serviços
administrativos, a Maxam, que pertencem a dirigentes do Diretório Nacional.
Mais rigor no controle
Presidente
da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP, Silvio Salata defendeu mais rigor
no controle de gastos dos partidos e reconhece que o número de legendas – 35
atualmente – dificulta a fiscalização. “Se houver desvio de finalidade, as
contas são desaprovadas. A punição é, no máximo, a suspensão do fundo por um
período.”
O
advogado Marcos Monteiro, especialista em Direito Público, ressaltou o conflito
entre público e privado na destinação dos recursos. “Os partidos devem respeitar
os princípios da administração pública, como isonomia e economicidade, mas são
considerados organizações privadas. Não há obrigação de licitação, por exemplo.
É dinheiro público que passa para instituição privada”, disse. Segundo ele, a
lei não exige o mesmo rigor na prestação de contas em anos em que não ocorrem
eleições.
O
TSE baixou uma resolução exigindo, a partir de abril deste ano, a digitalização
de todas as notas, para publicá-las mensalmente na internet. A estratégia,
segundo o secretário-geral do tribunal, Luciano Felício Fuck, é olhar para
frente e montar uma “força-tarefa” para apurar o montante entre 2012 e 2016.
Enquanto
isso, desde 2015, os partidos se articularam para ampliar o valor do fundo. No
ano passado, após a proibição das doações de pessoas jurídicas e diante do
entendimento de que não há espaço para a volta do financiamento empresarial –
principalmente em razão das revelações da Lava Jato –, líderes no Congresso
passaram a discutir a criação de um fundo bilionário com dinheiro público para
custear campanhas. (AE)
Segunda-feira,
13 de Março de 2017 ás 08hs50
Salmo
119 e o 126
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