Ação
proposta ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, afirma que a restrição de acesso às investigações de acidentes
aéreos no Brasil é inconstitucional. Para Janot, a proibição legal prevista no
Código Brasileiro da Aeronáutica suprime o direito de defesa, dificulta o
direito de acesso à Justiça e à ampla defesa e cria entrave à titularidade da
persecução por parte do Ministério Público. As informações foram divulgadas
pelo Ministério Público Federal nesta segunda-feira, 3.
A
ação questiona artigos da Lei 7.565/1986 (Código Brasileiro da Aeronáutica)
inseridos pela Lei 12.970/2014, que tratam do acesso a informações do Sistema
de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Sipaer) e sobre a
proteção de seu sigilo nas investigações de acidentes aéreos no Brasil. Segundo
Janot, os dispositivos violam o Artigo 5º, incisos XXXV, LIV (quanto aos
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, que compõem a cláusula do
devido processo legal substancial) e LV, o Artigo 37, caput (relativamente aos
princípios da finalidade e da eficiência), o Artigo 129, I, VI, VIII e IX, e o
Artigo 144, parágrafos 1º, I, e 4º, da Constituição da República.
Janot
explica que a norma passou a vedar o acesso aos sujeitos do processo judicial
ou administrativo a dados dos sistemas de informações de notificação voluntária
de ocorrências e às conclusões de suas investigações sobre acidentes aéreos.
"Essa
vedação colide com a proteção constitucional ao devido processo legal, constante
do artigo 5º, LIV, da Constituição da República, e seus consectários lógicos: a
ampla defesa e o contraditório (que integra a primeira)", argumenta.
De
acordo com a ação, ao prever que as análises e conclusões da investigação do
Sipaer não serão utilizadas para fins probatórios em processos e procedimentos
administrativos e judiciais e que somente serão fornecidas mediante requisição
judicial, "claramente veda acesso de pessoas e órgãos envolvidos a
informações que são de seu legítimo interesse e necessárias ao cumprimento de
sua missão constitucional, no caso de órgãos do sistema de justiça, como o
Ministério Público e a polícia criminal", destaca.
"Proibir
que investigação conduzida por órgão técnico da administração pública, como é o
Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), seja
usada para fins judiciais equivale, em termos concretos, a denegar acesso ao
Judiciário a órgãos e cidadãos com legítima expectativa de terem apreciados os
litígios de seu legítimo interesse, amparado pela Constituição da
República", argumenta o procurador-geral.
Janot
também sustenta que os dispositivos impugnados cerceiam o exercício das
atribuições do Ministério Público no processo penal, de modo a violar
diretamente o artigo 129, VIII, da Constituição, que define como função
institucional do Ministério Público requisitar diligências investigatórias e
instauração de inquérito policial. Segundo ele, a norma cria entrave à
titularidade da persecução por parte do Ministério Público e à função de investigação
criminal das polícias federal e civil, conforme o caso.
"Como
a investigação aeronáutica não possui finalidade essencialmente criminal, é
perfeitamente possível que as autoridades dela encarregadas não se preocupem ou
não enxerguem elementos que, aos olhos dos órgãos envolvidos na persecução
penal, possam ser aptos a amparar o início de investigação criminal",
destaca.
O
procurador-geral da República aponta que depender de um juízo de valor das
autoridades aeronáuticas seria um "inaceitável condicionamento do início
da investigação criminal à avaliação discricionária das autoridades
aeronáuticas". Para Janot, seria transferir aos órgãos do Sipaer uma
espécie de competência para avaliar, de forma soberana e sem controle, a
existência de indícios de delito, "uma verdadeira usurpação da opinio
delicti que é privativa do Ministério Público".
A
ação pede a concessão de medida cautelar (liminar) para que os dispositivos
questionados sejam o mais rapidamente possível suspensos. Isso porque o perigo
na demora processual pode permitir que "se perpetue a criação
desarrazoada, ineficaz e ilegítima de reserva de jurisdição que dificulta a
ação do Ministério Público, da polícia criminal e de cidadãos vítimas e
familiares de vítimas de acidentes aéreos de exercerem sua prerrogativa
constitucional de promover ação penal pública devidamente instruída e de obter
acesso à Justiça".
O
processo que gerou a ação direta de inconstitucionalidade originou-se de
representação apresentada pela Procuradoria da República em São Paulo e
"aproveita trechos relevantes da representação subscrita" pelo
procurador da República Rodrigo de Grandis, assinala Janot. (AE)
Terça-feira,
4 de Abril de 2017 ás 10hs20
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