Nas entrelinhas do discurso
oficial petista e nas manifestações explícitas da militância que abundam nas
redes sociais se consolida a afirmação do princípio de que em política os fins
justificam os meios e, por isso, os condenados do mensalão - os filiados ao PT,
claro, pois os demais são ignorados - foram injustiçados e não merecem estar
presos.
É mais ou menos como se os petistas tivessem
decidido que seus destemidos agentes empenhados na luta do Bem contra o Mal
são, como James Bond, justiceiros portadores de uma licença especial para, no
caso, serem corruptos. São os heroicos agentes 0013.
Recentemente encontrei no Facebook
pelo menos três militantes petistas diferentes defendendo com todas as letras a
ideia de que é preciso ter a coragem de assumir, realisticamente, que é
"impossível" governar sem o apoio de uma ampla aliança partidária, o
que implica, infeliz, mas inevitavelmente, a presença de políticos de má
reputação nas linhas governistas. Cerca de 20 anos trás, logo após ter passado
pela experiência de ser deputado federal como constituinte, Lula proclamou - e
todos sabem que com razão - que o Congresso Nacional estava infestado por
"300 picaretas".
Depois ele assumiu o governo por
oito anos e hoje, provavelmente, esse número é bem maior. Significa que o PT
renegou a sua pregação histórica pelo saneamento da política e, em vez de, no
poder, combater a corrupção que sempre denunciou, preferiu tratar os corruptos
com indulgência e até mesmo, quando necessário, a eles se aliar.
Mas é preciso tomar cuidado com a
afirmação de que o PT se aliou aos corruptos, porque a colocação da questão
nesses termos implica aceitar que os corruptos estão todos fora do PT e são
apenas "aliados" circunstanciais. A verdade é que Lula e seu partido
renunciaram ao bom combate contra a corrupção e, em nome da
"governabilidade", a ela se renderam. Dilma Rousseff que o diga. Basta
ver como foi constrangida a recuar na "faxina" que promoveu nos altos
escalões do governo logo nos primeiros meses de seu mandato.
É natural, portanto, que agora os
petistas procurem defender os seus condenados por corrupção no episódio do
mensalão, recorrendo, como de hábito, ao ataque como a melhor defesa. A
tentativa de demonizar o ministro-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)
faz parte desse jogo. Para os companheiros de Lula, Joaquim Barbosa é quem
merecia estar na cadeia, por não ter respeitado a licença especial dos agentes
0013.
Mas quando se fala em corruptos do
PT e no caso do mensalão se impõe uma ressalva relativa a José Genoino. Ninguém
de boa-fé há de duvidar da honestidade pessoal e do espírito público do
ex-presidente do PT, atualmente encarcerado. Muito diferente de José Dirceu,
hoje um homem rico que, apeado do poder formal, se dedicou a ganhar dinheiro,
muito dinheiro, explorando seus contatos e sua influência nos governos
petistas, Genoino vive de modo compatível com sua condição de cidadão de classe
média. Acontece que, por ironia, não foi preciso aplicar a teoria do domínio do
fato para condenar Genoino, pois ele próprio se encarregou de fornecer provas
irrefutáveis de seu envolvimento no esquema do mensalão, assinando como
presidente do partido as autorizações para o tesoureiro Delúbio Soares fazer a
movimentação financeira ilegal que abasteceu o propinoduto viabilizado por
Marcos Valério.
Lula - que, apesar do sentimento
de onipotência de que é possuído, amarga a frustração de seu propósito de
"desmontar a farsa do mensalão" - tem abusado do direito de ser
insensato em suas recentes investidas contra o Supremo Tribunal Federal. Ainda
há pouco se queixou de que, para "eles", "a lei só vale para o
PT". Numa só frase, duas tolices. Uma, o ato falho de admitir que o STF
aplicou a lei no julgamento do mensalão. A outra, ignorar que, além do PT,
outros partidos foram atingidos pelas condenações, inclusive o grande aliado
PMDB.
Essa, enfim, é a lógica de um
partido que tem a pretensão de se apresentar como detentor exclusivo da fórmula
da felicidade para o Brasil. Em seu maniqueísmo, os petistas pretendem
convencer a Nação de que os inimigos são, não importa no que acreditem ou o que
façam, todos aqueles que... não são petistas. Até os aliados, mesmo os de
boa-fé, são tratados com uma tolerância que não vai além dos limites estritos
dos interesses eleitorais de quem almeja perpetuar-se no poder. Um fim que
justifica todos os meios. E a serviço do qual foi concebido o intrépido
esquadrão dos agentes 0013.
A. P. QUARTIM DE MORAES – JORNALISTA - O Estado de S.Paulo
Quinta-feira, 05 de dezembro, 2013.
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