Primeiro, eles
acusavam a imprensa de ser um "partido de oposição" e pouca gente se
incomodou.
A acusação era tão absurda que não poderia
colar. Numa sociedade democrática, relativamente estável e minimamente livre,
os jornais vão bem quando são capazes de fiscalizar, vigiar e criticar o poder.
O protocolo é esse. A normalidade é essa.
Logo, o bom jornalismo pende mais para a oposição do que para a situação; a
imprensa que se recusa a ser vista como situacionista nunca deveria ser
atacada.
Enfrentar e
tentar desmontar a retórica do poder, irritando as autoridades, é um mérito
jornalístico. Sendo assim, quando eles, que se julgavam aguerridos defensores
do governo Lula, brandiam a tese de que a imprensa era um "partido de
oposição", parecia simplesmente que os jornalistas estavam cumprindo o seu
dever - e que os apoiadores do poder estavam simplesmente passando recibo. Não
havia com o que se preocupar.
Depois, as
autoridades subiram o tom. Falavam com agressividade, com rancor. A expressão
"partido de oposição" virou um xingamento. Outra vez, quase ninguém
de fora da base de apoio ao governo levou a sério.
Afinal, os jornais, as revistas e as emissoras
de rádio e televisão não se articulavam nos moldes de um partido: não seguiam
um comando centralizado, não se submetiam a uma disciplina tipicamente
partidária, não tinham renunciado à função de informar para abraçar o
proselitismo panfletário. Portanto, acreditava-se, o xingamento podia ser
renitente, mas continuava sendo absurdo
Foi aí que a
imprensa entrou no credo. Na falta de outra instituição disposta a não se
dobrar ao poder, disposta a desconstruir os cenários grandiloquentes armados
pelas autoridades, eles encontraram na imprensa a sua razão de viver e de
guerrear.
Só assim, só com
seu inimigo imaginário bem definido, esse discurso encontra seu ponto de
equilíbrio: ficar no poder e ao mesmo tempo acreditar - e fazer acreditar - que
está na oposição, que combate um mal maior. Seus adeptos, que imaginam odiar a
imprensa sem se dar conta de que a temem, agarram-se à luta com sofreguidão.
Estão em ponto de bala para o ano eleitoral de 2014.
Mesmo assim,
feliz ano-novo.
EUGÊNIO BUCCI - O Estado de
S.Paulo
Sexta-feira, 27 de dezembro, 2013.
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