O presidente a ser eleito neste
ano vai receber a pior herança econômica desde Itamar Franco, cuja posse foi em
outubro de 1993 em razão da renúncia de Fernando Collor de Mello, que seria
fatalmente colhido pelo impeachment. No baú de heranças negativas estará a
falta de manobra na área externa diante de um ambiente econômico internacional
pouco fulgurante para o Brasil e da acelerada desindustrialização, que causa
pesados déficits na balança comercial. Também há a pressão fiscal: custeio em
alta contínua, despesas crescentes com juros e subsídios selvagens à área
energética, semiestagnação econômica, que freia o crescimento da arrecadação, e
Estados em má situação orçamentária devida ao ano eleitoral de 2014.
O próximo presidente vai
enfrentar ainda problemas agudos nas áreas de saúde e de segurança pública, e
há a chaga social provocada pelas drogas. Essas três questões são as que mais
afligem dois terços dos brasileiros.
Na economia, a inflação reprimida
está à espreita. Tarifaços nas áreas de energia elétrica, combustíveis e
transportes urbanos serão inevitáveis em 2014, a menos que se replique entre
nós a desastrosa experiência do governo dos Kirchners, na Argentina,
comprimindo preços, deteriorando a capacidade de cada um desses setores e
expandindo ainda mais desabridamente os subsídios fiscais.
Um analista atento e
desapaixonado, não precisa ser da oposição, concordará com a tese de que o pior
cenário para enfrentar os problemas nacionais seria o sucesso da reeleição.
Invertendo o ditado popular, quem pariu Mateus é o menos indicado para
embalá-lo. Com a reeleição não daria para evitar uma deterioração rápida e
forte das expectativas sociais e dos agentes econômicos. Não existiria, por
exemplo, o voto de confiança de que todo novo governo dispõe para corrigir
rumos.
De fato, o foco principal da
crise brasileira hoje em dia está no governo. O pesadelo dos agentes econômicos
não reside tanto nos indicadores ruins sobre a economia, mas na possibilidade
de o governo Dilma se prolongar por mais quatro anos.
Nenhum governo é imune a
equívocos, maiores ou menores. Mas a singularidade dos governos do PT foi
transformar o que deveria ser uma anomalia em método. O caso da Petrobrás é
eloquente. Havia um sistema de concessões de exploração de petróleo que
funcionava bem, expandindo a produção e entregando um enorme poder ao governo
para extrair receitas. Mas deu-se nó em pingo d'água e criou-se para o pré-sal
um novo método, de "partilha", que tornou obrigatória a presença
direta da empresa em cada poço, com um mínimo de 30%. Como ela não tem
capacidade executiva nem recursos para tanto, isso complicou sua situação
financeira e operacional, já agravada pelo represamento de seus preços como
estratégia para reprimir a inflação.
A gestão incompetente, a falta de
pulso do governo e o loteamento político desenfreado levaram também ao fracasso
dos investimentos em refinarias. Em Pernambuco, a construção da Refinaria Abreu
e Lima, orçada em US$ 2,5 bilhões, não sairá por menos US$ 20 bilhões e ficará
pronta cinco anos depois do prazo. Outras duas, no Maranhão e no Ceará, mal
saíram do papel. No Rio, a Comperj repete a rotina de atrasos, estouro absurdo
do orçamento, etc. E há, como sabem os leitores, a pexotada da refinaria de
Pasadena. Se faltaram à então ministra e conselheira Dilma Rousseff as
informações adequadas para impedir, em 2006, a Petrobrás de fazer um negócio
desastroso, ela dispunha, nos anos seguintes, de todos os dados de que
precisava para cobrar responsabilidades: como conselheira, ministra e
presidente. Os procedimentos em curso na Petrobrás, se aplicados à iniciativa
privada, quebrariam qualquer empresa.
As consequências disso tudo são
conhecidas: estagnação da produção nacional de petróleo e aumento de cinco
vezes do volume importado de gasolina entre 2010 e 2013. Pelo conceito do custo
de oportunidade, a perda da Petrobrás no acumulado de janeiro de 2003 a
dezembro de 2013 foi de R$ 53,4 bilhões. Tornou-se a empresa de petróleo mais
endividada do mundo e perdeu metade do seu valor de mercado.
Para quem não sabe aonde vai
todos os caminhos são bons. Quando, no entanto, quem está sem rumo comanda um
país, aí todas as escolhas são ruins.
José Serra* - O Estado de S.Paulo
*Ex-prefeito e ex-governador de São Paulo
27 de março de 2014 | 2h 09
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