Nunca antes na
história deste país o aparelho do Estado foi tão acintosa e despudoradamente
colocado a serviço dos interesses eleitorais dos detentores do poder. Dilma
Rousseff não consegue fazer a máquina do governo funcionar com um mínimo de
eficiência para planejar e executar os grandiosos projetos de infraestrutura
que anuncia com enorme estardalhaço. Mas como numa campanha eleitoral - no
momento, a prioridade absoluta do lulopetismo - o que vale é o marketing, o
discurso, Dilma está bem instruída e firmemente empenhada em transformar em
palanque essa imensa e inoperante máquina, e dele não pretende descer antes das
eleições presidenciais do próximo ano.
No feriado de
Finados, Dilma reuniu no Palácio da Alvorada 15 ministros que atuam nas áreas
social e de infraestrutura para puxar orelhas e exigir "agilidade" no
anúncio de novos projetos e na execução daqueles em andamento. E deixou
perfeitamente claro, para quem pudesse não estar entendendo do que se tratava,
que precisa incrementar urgentemente uma "agenda positiva" a ser
exibida em seus pronunciamentos oficiais e suas cada vez mais frequentes
viagens por todo o País.
Antes que alguém
pudesse levantar alguma suspeita maldosa sobre toda essa movimentação ter a ver
com objetivos eleitorais, coube à ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann
- ela própria candidatíssima ao governo do Paraná - explicar: "Isso tem a
ver com resultado de governo. Nós estamos num momento de prestação de contas e
entregas". E acrescentou: "São várias entregas que a presidente
cobrou, que se agilizassem alguns resultados para que nós pudéssemos prestar
contas para a população". Então, está explicado.
Dá para entender
a aflição de Dilma. Uma reeleição considerada favas contadas no primeiro
semestre do ano passou a ser vista com preocupação pelos próprios petistas a
partir do instante em que os índices de popularidade da presidente despencaram
com as manifestações populares de junho e, apesar de se terem recuperado em parte,
mantêm-se ainda muito abaixo dos mais de 50% de aprovação anteriores.
Permanecem teimosamente empacados nos 38%. Isso significa que, na melhor das
hipóteses, a se manter o quadro atual, Dilma poderá se dar por satisfeita se
conseguir levar as eleições presidenciais para o segundo turno.
Não é por outra
razão que Luiz Inácio Lula da Silva, inventor do poste que conseguiu
transformar em presidente, decidiu chamar para si a responsabilidade de
confrontar os candidatos de oposição. Mergulhou de cabeça na tarefa de fazer o
que Dilma pode ter vontade, mas não tem vocação nem carisma para fazer, apesar
de toda a máquina governamental à sua disposição: comunicar-se com a massa
popular.
Nessa linha, o
ex-presidente tem usado e abusado de seu insuperável populismo. Ele sabe que,
mais do que "prestar contas" ou "entregar" realizações de
governo, o importante é encantar os eleitores com as palavras que eles querem
ouvir, ditas de um modo que eles gostam de escutar. E nisso Lula é mestre.
Apesar de integrar hoje, movido por sua megalomania, o mais seleto jet set
internacional, Lula tem logrado preservar a imagem de "homem do
povo", sustentada por altíssimos índices de popularidade. E isso lhe
permite ignorar a lógica, o bom senso, o pudor, a civilidade e, sobretudo, a
verdade, quando deita falação sobre as maravilhosas realizações com as quais
resgatou o Brasil das mãos do "poderosos" e o transformou neste
paraíso em que automóveis e filé mignon estão ao alcance de todos.
Transformar a
máquina do governo em palanque eleitoral como Dilma Rousseff está fazendo,
portanto, é apenas uma das consequências da erosão da moralidade pública que há
mais de uma década se tem acentuado gravemente no País. Lula e o PT, é claro,
não inventaram os malfeitos no trato da coisa pública. O Brasil sempre sofreu
com a tradição paternalista e patrimonialista. Mas foi prometendo acabar com
essa pesada herança que Lula e sua turma conquistaram, ou melhor, se
apropriaram do poder. Natural, portanto, que se disponham a usar o que
consideram seu para se eternizarem onde estão.
O Estado de S.Paulo
Domingo 10 de novembro 2013
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