Todos os dias a
Justiça manda para a cadeia pessoas que têm contas a acertar com a sociedade. É
uma rotina na qual pouco se presta atenção. Mas isso deixa de ser corriqueiro,
é claro, quando os condenados são altos dirigentes partidários, parlamentares,
banqueiros, publicitários, enfim, gente que a polícia não costuma abordar na
rua para pedir documentos.
É compreensível, portanto, que exatamente no dia em
que a República comemorava o seu 124.º aniversário, e mais de oito anos depois
da denúncia, todas as atenções da Nação, marcadas por um predominante
sentimento de alívio e esperança, se voltassem para as notícias de que o
Supremo Tribunal Federal emitira uma primeira leva de mandados de prisão contra
uma dúzia de condenados no processo do mensalão. Entre eles os mais notórios,
porque gente graúda do Partido dos Trabalhadores (PT): José Dirceu, José
Genoino e Delúbio Soares.
O sentimento de
alívio e esperança se deve à confirmação de que a Ação Penal 470 pode estar
realmente anunciando o início do fim da impunidade dos poderosos. Que a
corrupção, mesmo aquela praticada em nome do "bem maior", dá cadeia.
E esse sentimento se inspira também no fato tão raro quanto auspicioso de que
veio de cima, afinal, um bom exemplo. Um exemplo que todos esperam que se
dissemine pelas instâncias inferiores do aparelho Judiciário.
A consciência
cívica brasileira teve, portanto, mais do que o aniversário da República a
comemorar no dia 15 de novembro. Pode dedicar-se também à comemoração serena,
sem rancores, de um passo importante para a consolidação entre nós do império
da lei. Pois, mais do que uma desastrada tentativa de cooptar pelo suborno os
tais "300 picaretas" que Lula, com toda razão, disse nos anos 90 que
infestavam o Congresso, o caso do mensalão é emblemático da mentalidade de que
ao governo - ao deles, claro - tudo é permitido.
Não surpreende,
portanto, a lamentável reação da elite petista à decretação das prisões, tanto
por parte daqueles que se sentiram na obrigação de prestar solidariedade
pública aos camaradas encarcerados quanto a dos próprios condenados. É sabido
que quem não está com os petistas está contra eles - que consideram ter
inimigos, não adversários. E esse maniqueísmo se aplica, também - como mostram
à farta as manifestações da elite do PT -, ao tratamento que dão aos meios de
comunicação, às leis do País e ao funcionamento do Judiciário. Lei boa e
merecedora de respeito é aquela que os favorece. Vale exatamente o mesmo para
as sentenças judiciais.
A prisão dos
mensaleiros ativou a síndrome de perseguição dos companheiros de Lula. Para
José Dirceu, a sentença que o condenou é "espúria". Num longo
manifesto, repleto de lugares-comuns e frases feitas que lembram antigos
discursos de agitação estudantil, Dirceu acusa ministros da Suprema Corte de
terem votado sob pressão da "grande imprensa". E protesta: "É
público e consta dos autos que fui condenado sem provas". Não faz a menor
cerimônia para fabricar sua própria versão dos acontecimentos.
Fonte: O Estado de S.Paulo
Segunda-feira 18 de novembro 2013
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